A nova polêmica da vez refere-se à opinião do goleiro Rogério Ceni, do São Paulo, acerca da postura do atacante Neymar, do Santos, diante da marcação (muitas vezes implacável, é verdade) dos defensores do futebol brasileiro. “Garanto que nem 50% das entradas são faltosas, nem 50%. Agora, que ele é o melhor jogador do Brasil não se discute. Mas em 50%, é simulação”, opinou o capitão do Tricolor ao Bem, Amigos, do Sportv. Logo a joia santista respondeu com um texto em seu site oficial, de autoria do jornalista Alex Bernardo, dizendo que é preciso “proteger o talento” e atacando o arqueiro diretamente: “Rogério Ceni é chato pra c******”.
Ao tocar no assunto, Ceni abordou, mesmo que de forma indireta, uma cultura lamentável que está no DNA de boa parte dos atacantes do futebol brasileiro: o cai-cai, que consiste no abandono de chances de criação ou conclusão de jogadas para ludibriar o árbitro em simulações espetaculosas de faltas ou pênaltis. Também indiretamente, boa parte dos torcedores brasileiros não corroboram com tal postura. Prova disso é a idolatria aos jogadores de cultura totalmente oposta ao cai-cai, como argentinos e uruguaios. Craques ou não, torcedores daqui não cansam de exaltar a incansável luta de jogadores como Tevez ou Herrera (exemplos atuais e diametralmente opostos quanto à técnica). Pelo globo, cresce a admiração pelo futebol de jogadores como Rooney, Drogba, Forlán ou Diego Milito, de características semelhantes na luta para balançar as redes.
Com todas as restrições que possam existir sobre a postura de Ceni, trata-se de um jogador diferenciado do estereotipado por aqui, culturalmente e na maneira de se expressar. E especificamente nesse caso, a opinião do veterano não foi pejorativa ao brilhante futebol do santista. Falar em “50%” é algo hipotético, uma figura de linguagem que mostra que muitas das faltas marcadas sobre Neymar não são legítimas. Fato que não encobre, por exemplo, que Neymar foi o grande responsável pela conquista da Libertadores 2011 pelo Santos. Nem que Rogério deu uma opinião equivocada sobre o mesmo Neymar sobre a nefasta paradinha, em fevereiro de 2010, já que o camisa 1 usou deste artifício para marcar alguns dos seus gols de pênalti.
Nenhum jogador, craque ou brucutu, deve ter “atenção especial” da arbitragem. Por ter mais recursos técnicos, o camisa 11 tem maior chance de se livrar dos zagueiros. E também de ser caçado impiedosamente por eles. É onde deveria entrar a arbitragem, punindo quem é passível de punição. E até o polêmico STJD, dependendo da gravidade da infração/agressão que extrapole o aceitável nas quatro linhas.
Muitos comparam Neymar a Messi. Ambos têm talento inegável, já decidiram campeonatos e são estrelas do futebol mundial – o craque do Barcelona, mais velho, tem mais tarimba e está muito à frente do brasileiro, em minha visão. Contudo, a grande diferença entre eles em situações como essa é a cultura futebolística. Com a bola colada no pé e sem medo dos defensores, Messi apanha, mas é difícil de ser derrubado e marca gols antológicos com maior frequência. Neymar, em diversas oportunidades, prefere a segurança do gramado, após um mergulho cinematográfico. Mesmo tendo técnica para criar pérolas tão frequentemente quanto o camisa 10 do Barcelona e da Argentina.
E o destino inevitável da carreira de Neymar, o futebol europeu, já está de olho não só em sua técnica inegável, mas também da capacidade “cênica” do prodígio brasileiro, como mostra o jornalista Mauro Cezar Pereira em seu texto sobre o assunto, em seu blog na ESPN. E lá não é como cá, já que os europeus prezam mais o jogo limpo (ao menos nesse caso), condenando o cai-cai, este produto no qual o futebol brasileiro é especialista em produzir. Com tanta criatividade quanto belas jogadas e um gol de prata, infelizmente.